Adultocentrismo
O adultocentrismo é um sistema de dominação social e cultural que impõe a referência adulta como a norma superior e acabada de existência, resultando na subalternização, desvalorização e controle de crianças, adolescentes e jovens.
Definição
O adultocentrismo refere-se à assimetria de poder normalizada entre adultos e não-adultos. Este fenômeno manifesta-se através da crença de que a fase adulta representa a plenitude do ser humano, enquanto a infância e a adolescência são vistas apenas como etapas de "preparação" ou "vir a ser", destituídas de validade no presente. Sob uma ótica crítica, apoiada em estudos da Sociologia da Infância (como os de Manuel Jacinto Sarmento ou Jens Qvortrup), o adultocentrismo não é natural, mas uma construção histórica que transforma a diferença de idade em desigualdade política e social. É crucial notar que o adultocentrismo opera de forma semelhante ao patriarcado e ao racismo, estabelecendo uma hierarquia onde o adulto (frequentemente o homem, branco e produtivo) detém a hegemonia da voz, da decisão e do uso do espaço, deslegitimando a capacidade de agência e participação social dos mais jovens.
Como funciona
O adultocentrismo funciona através de mecanismos de silenciamento, tutela excessiva e negação de direitos. A lógica predominante é a da "propriedade" ou "objeto de proteção", onde a criança não é vista como um sujeito de direitos, mas como um projeto futuro do adulto. Isso ocorre quando a sociedade se organiza exclusivamente para a rotina produtiva adulta. O sociólogo Pierre Bourdieu ajuda a compreender como essas estruturas se perpetuam através do habitus: a criança aprende a ser submissa e a aceitar que sua opinião é inválida, reproduzindo essa lógica quando se torna adulta. A estigmatização manifesta-se na desqualificação dos discursos infantojuvenis como "birra", "rebeldia sem causa" ou "falta de maturidade", ignorando as lógicas próprias e as competências das culturas infantis. As instituições (escola, família, Estado) frequentemente operam sob uma lógica vertical, onde obedecer é a única virtude esperada dos mais novos.
Exemplos
- Uma criança ou adolescente tenta expressar uma opinião política ou social e é imediatamente silenciado com frases como "você não tem idade para entender isso" ou "quando você pagar suas contas, você opina".
- O planejamento urbano das cidades prioriza o fluxo de carros e o trabalho (mundo adulto), eliminando espaços de brincar ou tornando as ruas hostis e perigosas para a circulação autônoma de crianças.
- Em contextos judiciais ou escolares, a palavra do adulto é automaticamente considerada a verdade, enquanto o relato da criança sobre abusos ou desconfortos é tratado com desconfiança ou minimizado.
Quem é afetado
O adultocentrismo afeta diretamente crianças, adolescentes e jovens adultos. No entanto, numa perspectiva interseccional, afeta desproporcionalmente crianças negras, indígenas, pobres e com deficiência, que sofrem múltiplas camadas de silenciamento. Paradoxalmente, o adultocentrismo também afeta idosos, que, ao perderem a "produtividade" associada à idade adulta hegemônica, passam a ser infantilizados e tutelados socialmente.
Por que é invisível
O adultocentrismo é invisível em grande parte devido à sua naturalização profunda na cultura. A sociedade confunde "cuidado" e "educação" com autoritarismo e controle. A ideia de que "sempre foi assim" e de que a submissão é necessária para a formação do caráter mascara a violência simbólica e física inerente a esse sistema. Diferente de outros preconceitos que são cada vez mais debatidos, a discriminação etária contra os mais jovens é frequentemente validada moralmente e legalmente sob o pretexto de "proteção".
Efeitos
Os efeitos do adultocentrismo são devastadores e estruturais. No nível individual, gera baixa autoestima, dependência emocional, falta de autonomia e dificuldades na tomada de decisão. Coletivamente, perpetua ciclos de violência, pois ensina que as relações humanas são baseadas na imposição do mais forte sobre o mais fraco. Além disso, priva a sociedade da criatividade, da inovação e da perspectiva única que as gerações mais novas poderiam oferecer se fossem escutadas como cidadãos plenos no presente.
Autores brasileiros
- Solange Jobim e Souza
- Benedito Rodrigues dos Santos
- Lúcia Rabello de Castro
- Antonio Carlos Gomes da Costa
Autores estrangeiros
- Jens Qvortrup
- Manuel Jacinto Sarmento
- Claudio Duarte
